Ministério Público emite nota de esclarecimento sobre matéria de meninas torturadas em Nova Veneza

O Promotor de Justiça, Mauro Canto da Silva, titular da 8ª Promotoria de Justiça da Comarca de Criciúma, emitiu nesta terça-feira, 19, nota de esclarecimento sobre a matéria veiculada no Portal Veneza intitulada “Tortura: mulher é presa por maus tratos as suas filhas”, publicada na tarde da última segunda-feira, 18.

Na nota o promotor esclarece que o Ministério Público jamais foi informado pelo Conselho Tutelar do município sobre qualquer violência, negligência ou outro fato envolvendo as crianças mencionadas na matéria, e que somente chegou ao conhecimento do Ministério Público, oficialmente, por correspondência eletrônica da Central de Plantão Policial de Criciúma, às 17h34min do último dia 18.

Leia a Nota na íntegra

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por seu Promotor de Justiça, titular da 8ª Promotoria de Justiça da Comarca de Criciúma, com atribuição na área da Infância e Juventude, a respeito da reportagem “Tortura: mulher é presa por maus tratos as suas filhas”, através do Portal Veneza (https://www.portalveneza.com.br/mulher-presa-por-maus-tratos-suas-duas-filhas/), vem a público ESCLARECER que:

Tomei conhecimento da notícia “Tortura: mulher é presa por maus tratos as suas filhas”, através do Portal Veneza (https://www.portalveneza.com.br/mulher-presa-por-maus-tratos-suas-duas-filhas/) no dia de ontem 18 de janeiro de 2016, data de sua postagem.

A nota traz a informação inicial de que “A Polícia Militar de Nova Veneza prendeu por volta das 19 horas do último domingo, 17, uma mulher de 31 anos, pelo crime de maus tratos a suas duas filhas de 4 anos.”

Diz, ainda, que “as crianças foram encaminhadas para a casa de um parente, mas podem a qualquer momento voltar para a casa da mãe por falta de um convênio entre o município e um abrigo.”

Ao final da matéria, foi dito, expressamente, que “Após várias ocorrências envolvendo um mesmo caso, as conselheiras ainda acusam de inércia, a Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da comarca de Criciúma, que mesmo cientes da situação, não apresentam uma alternativa para o caso das meninas.”

Diante desta observação, cumpre-me, como titular da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude os seguintes esclarecimentos:

1) As funções do Ministério Público encontram base no artigo 129, do Constituição Federal e, na área da Infância e Juventude, especificamente, estão elencadas, em rol exemplificativo, no artigo 201, do Estatuto da Criança e do Adolescente, e dentre elas destaco: “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (art.129, II)” e “zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis (art. 201, VIII);

2) A primeira diretriz da política de atendimento à crianças e adolescentes prevista no artigo 88, do ECA é a “municipalização do atendimento”, tornando o Município responsável, também, pela criação e manutenção de programas específicos de atendimento;

3) Dentre as políticas de atendimento encontram-se os programas de acolhimento familiar e acolhimento institucional que servem, de modo provisório e excepcional, para acolher crianças e adolescentes em situação de risco (art. 98, ECA), cujas entidades podem ser governamentais ou não governamentais, devidamente inscritas perante o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (art. 90, §1º) e cujos recursos necessários à sua implementação deverão estar previstos em dotação orçamentária (art. 90, §2º) que, registre-se, deve receber  “destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude”, por força do princípio da prioridade absoluta previsto no artigo 4º, do ECA.

4) Mesmo com a informação na matéria de que não teria sido a primeira ocorrência envolvendo a família, o “caso das meninas” ora retratado somente chegou ao conhecimento do Ministério Público, oficialmente, por correspondência eletrônica da Central de Plantão Policial de Criciúma, às 17h34min do dia 18 de janeiro de 2016 (Ofício nº 22/2016), não havendo qualquer outra comunicação de fatos pretéritos;

5) No referido Ofício 22/2016, assinado pelo Delegado de Polícia Dr. Marcelo Vianna e pelas conselheiras tutelares Sônia Frigo Brogni e Celita Salvaro Piava, afirmam, expressamente, verbis: “Outrossim, o presente ofício tem o escopo de informar ao Ilustre Membro do Parquet que as Conselheiras Tutelares narraram que não dispõem de local apropriado na cidade de Nova Veneza para abrigar crianças em situação similar às das crianças citadas no presente procedimento, inclusiva (sic) citando que o Prefeito Municipal encontra-se inerte, muito embora tenha sido colocado a par da situação, ou seja, a necessidade de se disponibilizar espaço adequado para abrigar crianças em situação de risco, quando necessário”.

6) O Conselho Tutelar é o órgão protetivo por excelência, “encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente” (art. 131, ECA) e atender crianças e adolescentes que se encontrarem com direitos violados, podendo, para tanto, aplicar medidas específicas de proteção à crianças e adolescentes (art. 101, I a VII, do ECA) além de aplicar medidas em face dos pais ou responsáveis (art. 129, I a VII, do ECA), no âmbito de sua competência, medidas estas que somente podem ser revistas pela autoridade judiciária;

7) Todavia, registro que até o momento, o Ministério Público não foi destinatário de qualquer comunicação por parte do Conselho Tutelar acerca de seu atendimento, providências e eventuais medidas de sua competência que porventura foram aplicadas (art. 136, ECA) ao “caso das meninas”;

8) Desta forma, é totalmente inverídica a informação e leviana a acusação das conselheiras tutelares de imputarem “inércia” à Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da Comarca de Criciúma, “que mesmo ciente da situação, não apresentam uma alternativa para o caso das meninas” por simples motivos: a) o Ministério Público jamais foi informado pelo Conselho Tutelar de qualquer violência, negligência ou outro fato envolvendo as mencionadas crianças; b) o Ministério Público não foi informado oficialmente acerca da não existência ou não renovação de convênio com entidade para o acolhimento de crianças e adolescente do município de Nova Veneza; c) não é de responsabilidade do Ministério Público a implantação ou manutenção de qualquer política de atendimento, mas sim do Poder Público Municipal e de seus órgãos;

9) Cabe ao Ministério Público, como dito, zelar pelos serviços de relevância pública e pelos direitos das crianças e adolescentes, mas não pode ser acusado de inércia ante a ausência de um serviço não prestado pelo Município nem, muito menos, por não agir diante do não conhecimento de qualquer situação;

Por fim, reputo lamentável e repudio veementemente a declaração das conselheiras tutelares que atenderam a ocorrência, afirmando que tal postura enfraquece a defesa dos direitos de crianças e adolescentes do município de Nova Veneza, violando, sobretudo, uma das diretrizes de política de atendimento que é a “integração operacional de órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Conselho Tutelar e encarregados da execução das políticas sociais básicas e de assistência social, para efeito de agilização do atendimento de crianças e de adolescentes inseridos em programas de acolhimento familiar ou institucional, com vista na sua rápida reintegração à família de origem ou, se tal solução se mostrar comprovadamente inviável, sua colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei”  (art. 88, VI, do ECA).

A Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de Criciúma reafirma seu compromisso na defesa intransigente dos direitos das crianças e adolescentes e não se furtará em adotar as medidas necessárias para a devida proteção.

Mauro Canto da Silva
Promotor de Justiça
8ª PJ de Criciúma

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