Pesquisa com terapia genética impede que vírus zika deixe sequelas em cérebro de fetos de camundongos

Em estudo realizado em camundongos, pesquisadores atrelaram antivirais a vesículas que atravessaram a placenta e a barreira hematoencefálica.

Técnica de silenciamento gênico impediu a transmissão do vírus zika para os fetos de camundongos, em estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Nanquim, na China. Liderada pelo pesquisador Zhiwei Wu, a equipe usou nanopartículas, chamadas de pequenas vesículas extracelulares (ou sEVs, na sigla em inglês), para entregar, diretamente aos fetos dos animais, os medicamentos antivirais que inibem a ação do zika.

Capazes de atravessar a placenta e a barreira hematoencefálica – uma espécie de muralha que protege o sistema nervoso central de substâncias tóxicas –, as vesículas com a medicação atrelada conseguiram diminuir significativamente os danos neurológicos fetais causados pelo vírus, inclusive a redução do tamanho do cérebro, a chamada microcefalia.

Além de suprimir a infecção, a técnica também atuou contra a inflamação e os danos neurológicos, como os defeitos na região do cérebro denominada de cerebelo. Os resultados do trabalho foram publicados na revista científica Molecular Therapy.

Embora promissor, os pesquisadores reforçam que o estudo ainda é preliminar e afirmam que serão necessários mais estudos até que esse tipo de tratamento seja usado em seres humanos. “Aumentar o rendimento e a eficiência na produção, e o desenvolvimento de sEVs que tenham como alvo outros tecidos ampliará a aplicação e a eficácia da técnica de entrega de genes”, destacam os autores no artigo publicado.

Brasil viveu surto em 2015

Considerada uma doença com sintomas mais brandos que suas “primas”, a dengue e a Chikungunya (todas transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti), a zika entrou no radar brasileiro entre 2015 e 2016 como uma emergência sanitária. No período, houve um surto de bebês nascidos com microcefalia, sequela associada ao vírus, que causava danos neurológicos mesmo antes do nascimento.

O aumento de casos teve um pico expressivo principalmente na região Nordeste do País. Dados do Ministério da Saúde apontam que, entre 2015 e 2020, foram notificados 19.622 casos suspeitos de Síndrome Congênita associada à infecção pelo Zika vírus (SCZ). Desses, 3.577 foram confirmados. Embora o período de emergência tenha sido encerrado, novos casos da síndrome ainda ocorrem, de acordo com o órgão, e há suspeitas de que o vírus entrou no Brasil antes do que é relatado na literatura científica. 

Pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) encontraram evidências de aumento de casos de microcefalia associadas ao zika ainda em 2014, um ano antes do período de surto registrado. A Paraíba foi o terceiro Estado em notificações de SCZ, atrás apenas da Bahia e Pernambuco, respectivamente.

Situação brasileira segue inalterada

Não há nada que indique que as condições que propiciaram o surto do vírus zika no Brasil em 2015 foram resolvidas, segundo Bernadete Perez, médica sanitarista e professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). “Ainda temos áreas urbanas de grande vulnerabilidade, sem saneamento básico e acesso à água encanada, obrigando o armazenamento e aumentando os riscos de surgimento do mosquito”, afirma.

Perez, que também é supervisora do Programa de Residência em Medicina de Família e Comunidade do Hospital das Clínicas da UFPE (da Rede Ebserh), coordena desde 2016 um estudo para acompanhar crianças nascidas na instituição com a síndrome. “A frequência diminuiu, mas esses bebês continuam nascendo”, afirma. “O problema não acabou e continua muito grave, tanto pelos que já nasceram e sofrem com a falta de atendimento adequado, quanto pelas gestantes expostas ao mosquito”, diz.

A professora alerta ainda que a falta de políticas públicas para conter a expansão do Aedes aegypti, mosquito transmissor de diversas arboviroses, mantém todos em alerta para o próximo surto da doença. “É muito difícil erradicar o mosquito, já que ele está adaptado às cidades, mas é plenamente possível controlar a presença”, acredita.

Por Isabella Sanches, da Agência Einstein