Moradora de Nova Veneza é premiada pela Academia Criciumense de Letras

30/08/2017 20:38

Marlene Bressan recebeu premiação pela categoria de contos.

Nova Veneza tem mais uma área para se orgulhar. Nesta semana, a escritora Marlene Bressan conquistou o primeiro lugar do prêmio da Academia Criciumense de Letras na categoria de contos. No ano passado ela já havia ganhado a premiação com uma crônica.

Em meio a vários participantes, que inscreveram contos, crônicas ou poesias, a neoveneziana afirma que se sente bastante lisonjeada e feliz com o reconhecimento. “Eu sempre quis escrever um livro, mas não tinha tempo. Como faço revisão de livros, corrijo trabalhos de conclusão de curso e dou aulas de redação para quem precisa enfrentar o vestibular, já li muitos livros, quase 600. Sempre fui uma rata de biblioteca, como se costuma dizer, e incentivo muito meus alunos a também lerem com frequência”, argumenta.

A escritora, que foi sócia fundadora e presidente da Associação Neovenezina de Escritores (ANE) ressalta que essas obras premiadas são fruto de experiências já vividas. “Quando eu era pequena, minha mãe me incentivava bastante a ler, tanto que fui cursar letras, com especialização em literatura pela Universidade de Passo Fundo. Estou muito contente com mais essa premiação”, finaliza.

O conto premiado pode ser lido, na íntegra, abaixo:

A vaca Mocinha e o garrote cor de pilão

Conto   

Dona Chica deu a luz ao filho donzelo do coronel Siamarildo Rosa, depois de haver parido cinco meninas; o filho varão que iria perpetuar a raça e o nome da família do fazendeiro.

O menino nasceu forte e berrando como um touro… criou-se voluntarioso, sempre paparicado por todos. Levou o nome de Luizão e começou cedo a acompanhar os peões nas lidas da fazenda – Três Lagoas.

Em um de seus aniversários, Luizão ganhou de seu pai, um cão farejador. Batizou – o de Sirapopa porque era parecido com a cor das árvores da Sirapopeira, e que havia em abundância lá nos capões. O animal que tinha orelhas peludas, as  patas fortes e firmes, o pelo reluzente – fogoso, emancipado, de focinho e pescoço látego, late escandalosamente.

Nhô Florêncio, nego veio, capataz há muito tempo – confiante, compreensivo, com olhos bem salientes e cabelos de algodão, sente a falta da vaca Mocinha, de bom e abundante leite e do seu filho Japalão. O peão joga o laço nas costas, abre a porteira rangente e sai em passos marcheteiros, para ver se ouve o mugido solto de Mocinha e do garrote desgarrado da cor do pilão.

Luizão percebe a aflição do capataz e passa- o a acompanhar. Sente que a tarde se avança e chama seu fiel, peludo e inseparável companheiro, para ajudá-lo na trajetória da trilha do córrego que os conduziriam ao barreiro do brejo.

A siriema canta longe. As mariacacas fazem algazarra. A coruja pia nas copadas das árvores daquele imenso agreste. O urubu sorrateiro pressente carniça no ar. A preocupação começa a tomar conta de Nhô Florêncio. Nada de Mocinha. Nada de Japalão. Siripopa começa a latir. Esperança! Alarme falso! E a noite surge mansa… sorrateira, dengosa, morna, prometendo lua cheia.

O rapagão chama por Mocinha; grita. O cão havia avançado o caminho, farejando os desaparecidos, e agora voltava com ar estranho, com a língua para fora do focinho. Nem sinal dos cambitos da leiteira, nem do garrote ingrato.

– Sinhô Luizão, mior nóis passá a noite na gruta do eitão e esperá o dia claro chegá. Tamo longe, longe da casa da fazenda é até perigoso voltá. – Pode pintá onça pintada e querê servi nóis no jantá! -Quem sabe a danada vaca não aparece?

– Nhô Florêncio, você gosta do que faz? – Gosta da lida do campo, boi brabo, crias fujonas, vaquejando; sem filho, sem mulher?

Nhô acende o cigarro palheiro e também um fogo para espantar o medo e os bichos peçonhentos que houvesse por ali. – Já me acostumei a servi. Começa a falar do tempo que era moço e das histórias que os boiadeiros costumavam contar.

No mato, o vento assobia chamando chuva e trovoada assustadora, e sem demonstrar cansaço ou tristeza, feitor e sinhozinho continuaram as prosas do tempo de mocidade do peão, lá no Arraial do Picadão.

Conforme a noite avançava a fadiga começava a tomar conta, o sono não deixava as vistas acesas e os dois caíram num deleite profundo…

De madrugada, veio o vento, e os relâmpagos acompanhados das trovoadas. O crioulo curioso foi espiar o temporal e ver se a vaca fêmea e o filhote macho não estavam por perto; neste momento, o raio bateu-lhe em cheio, violento, mortal e deixou o serviçal estancado, hirto, embrulhado na lama, no leito da gruta do eitão.

Tanto fora a canseira que sinhozinho acordou com o sol raiando, escaldante, enervante. Viu o companheiro, nego véio, retorcido e logo entendeu o que havia sucedido. Chamou Sirapopa.

Começou a correr e o calor nervoso, fervente que enojentava o corpo suado, dava-lhe uma leseira além da conta e a ansiedade ia tomando os sentidos, o organismo e sentenciou entrar no rio Boqueirão e refrescar aquele torpor que o estava deixando enlouquecido.

Sentiu um pouco de medo, mas a angústia falou mais alto e ele pensou no bem-estar que sentiria se tomasse um banho e refrescasse o seu corpo encharcado, enlamaçado. Sentiu-se um pouco inseguro e resolveu chamar Siripopa, seu herege amigo de todas as horas.

Chamou Siripopa: -Vem! … -Vem!  Vamos refrescar nossas crinas.

Ele atendeu ao chamado do seu dono, companheiro desde os tempos de menino. Nadaram…nadaram e se esqueceram que deveriam procurar a vaca Mocinha e o garrote Jalapão, os quais estavam perdidos em algum lugar das imensas sesmarias daquele pobre sertão das Minas Gerais.

De repente, não mais do que de repente, os dois; cachorro e dono; amo e animal foram engolidos pelo estômago faminto da BOIÚNA-cobra grande, senhora das águas a qual habitava as profundezas daquele rio caudaloso, largo, perigoso e que banhava as terras do coronel Siamarildo Rosa .