Gôndola mortuária. Parte 2

Foi assustador quando Raul, delegado da cidade, chegou e viu uma grande fila na delegacia. Isso o surpreendeu, considerando que, por ser uma cidade pequena, a delegacia nunca teve tamanho movimento. Chegou, dando vários bons dias até entrar em sua sala e perguntar para os policiais, que o aguardavam com cara de espanto. Antes mesmo que ele pudesse falar algo, eles disseram:

  • Todos vieram com moedas.

Como um competente delegado, começou a recolher as moedas para perícia e tomar o depoimento de todos, todavia, basicamente, as histórias eram muito parecidas.

  • Quando acordei, vi que tinha uma moeda perto da porta, então a peguei e ela estava gelada e úmida.

Durante três dias, foi a mesma coisa na delegacia. Acumulou-se uma pilha de depoimentos e um balde cheio de moedas. Raul decidiu pedir para que as escolas mandassem outro bilhete dizendo para os pais que não precisavam mais ir até a delegacia, pois as provas já eram suficientes. Fez isso para poder investigar o caso, porque, se ele fosse tomar depoimento de todos os donos das moedas que tinha no lago, ficaria preso na delegacia por, no mínimo, um ano.

A primeira atitude investigativa que ele teve foi mandar esvaziar o lago para então ver se não havia restado mais nenhuma moeda ou se havia algum tipo de encanamento que pode ter sugado os miúdos. Ainda havia restado algumas moedas e os encanamentos não tinham nada de anormal. Em meio a investigação, Raul recebeu um telefonema que o informou que Seu Braga havia cometido suicídio. Ao chegar na residência, viu o velho homem pendurado pelo pescoço nos fundos da casa. No bolso, foi encontrado a moeda e um pedaço de papel que dizia:

PERDÃO AOS MEUS FILHOS E NETOS, PEÇO QUE NÃO FIQUEM TRISTES, POIS FUI ENCONTRAR SUA AVÓ. ELA VEIO ME CHAMAR, ELA ME DEVOLVEU A MOEDA.

O Monumento Histórico tinha feito sua primeira vítima, mesmo que indiretamente. O boato rodou pela cidadezinha. Só se falava isso em bares e na praça da cidade. O delegado acordou várias vezes durante aquela noite, pensou, anotou, foi até a cozinha, tentou dormir e logo, na primeira hora do dia, passou na delegacia, pegou o balde de moedas, foi até a Gôndola. Chegando lá, ele despejou as moedas novamente no lago. Era como se ele estivesse afrontando o Monumento. Puxou um banco e ficou ali sentado observando durante todo dia e, quando caiu a noite, pediu para um policial ficar em seu lugar para que pudesse ir até sua casa e tomar um banho, mas que já voltaria. Quando voltou, avistou de longe que o policial cochilava, com a cabeça pendida para frente. Chegando perto, viu que as moedas tinham desaparecido. Logo, gritou com o policial, o chamando de imbecil e irresponsável, mas ele pareceu não lhe ouvir. Foi tocando-o que Raul percebeu que se encontrava sem vida. O Monumento Histórico havia feito sua segunda vítima.

Logo pela manhã, o delegado foi até a central de câmeras e viu que o policial apenas baixou a cabeça e faleceu, ninguém o tocou e nem ao menos ele pareceu ter dado um gemido; ele simplesmente perdeu a vida. Isso ocorreu no momento que passa uma rajada de vento pelo local e a gôndola se mexeu e rangeu, em seguida, as moedas não estão mais lá. Foi nesse momento que o delegado percebeu que o que estava acontecendo tinha ido além de uma simples brincadeira ou vandalismo. Resolveu ir a fundo, pesquisar tudo sobre o lugar onde estava a gôndola, sobre a origem dela e sua história. Ligou para quem havia mandado-a para nova Veneza para pedir alguns detalhes do monumento. Ficou surpreso quando descobriu que o barco era uma gôndola mortuária no passado.